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O ESPETÁCULO DA EXCEÇÃO: UMA CÂMARA EM CRISE PERMANENTE

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O retrato da política institucional brasileira ficou mais uma vez escancarado em uma noite de escândalo e confronto, nesta terça-feira (9). Durante a sessão que discutia o Projeto de Lei da Dosimetria, o deputado Glauber Braga (PSol-RJ) ocupou fisicamente a cadeira da presidência da Câmara dos Deputados em um ato de protesto. Diante de sua recusa em se retirar do local, a Polícia Legislativa foi acionada, resultando na remoção forçada do parlamentar, que resistiu até o limite. A cena, capturada em vídeos que circularam amplamente, sintetizou um clima de exceção e ruptura do regramento interno, onde a força física suplantou o debate político.

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O ato do deputado foi premeditado e justificado como uma denúncia de seletividade. Em suas declarações, Glauber Braga afirmou: "Eu vou me manter aqui firme até o final dessa história. Se o presidente da Câmara quiser tomar uma atitude diferente daquela que ele tomou com os golpistas que ocuparam essa mesa diretora e que até hoje não tiveram qualquer punição, essa é uma responsabilidade dele. Eu ficarei aqui até o limite das minhas forças". A referência direta é a episódios anteriores, onde parlamentares de direita tomaram a Mesa Diretora, sem que houvesse, segundo o psolista, uma reprimenda equivalente. A reação da Casa foi imediata e contundente: jornalistas foram convidados a se retirarem do plenário e a transmissão oficial das sessões foi interrompida, levantando questões sobre transparência.

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A medida de interromper as câmeras e isolar o plenário gerou revolta imediata em parte do hemiciclo. Deputados da esquerda, assim como a deputada e ex-prefeita Luiza Erundina, se manifestaram veementemente contra o presidente em exercício, Hugo Motta (Republicanos-PB), classificando sua atitude como uma afronta à democracia e um ato de censura. O paralelo histórico foi inevitável: a cena lembrava, em sua natureza disruptiva, ações semelhantes protagonizadas por grupos de oposição meses antes. O episódio expôs, portanto, uma perigosa banalização de táticas de obstrução física, onde cada lado se nutre da narrativa de injustiça cometida contra o outro, em um ciclo vicioso de degradação institucional.

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Para além do confronto pontual, o que se observa é uma disfunção crônica que corrói o cerne do Poder Legislativo. A pauta de votações parece cada vez menos atrelada a um projeto nacional e mais subordinada aos humores do relacionamento entre a Mesa Diretora e o Palácio do Planalto. Quando há convergência, projetos prioritários ao governo avançam. Quando há atrito, pautas que o constrangem são colocadas em votação, num jogo de retaliação política. A recente aprovação da dosimetria do Poder Judiciário, por exemplo, é vista por muitos analistas menos como uma reforma técnica urgente e mais como uma manobra de pressão contra setores alinhados à esquerda. Paralelamente, iniciativas de interesse popular permanecem engavetadas indefinidamente.

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Assim, a Câmara dos Deputados parece operar em uma lógica perversa de "dança das cadeiras", onde o interesse público é sistematicamente preterido em nome de acordos de cúpula e retaliações políticas circunstanciais. A parceria entre a Presidência da Casa e a do Congresso, longe de orquestrar um trabalho produtivo, frequentemente atua para calibrar essa máquina de pressão e barganha. O resultado é uma sensação generalizada de que a instituição não trabalha em função da população, mas sim de uma política de boa vizinhança entre as elites do poder. O povo, como espectador impotente de brigas corporativas e manobras de bastidor, permanece à margem, pagando o preço por um parlamento que perdeu a noção de sua razão de ser.

Por: João Bosco

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